Canções por justiça: o movimento musical atacado pela ditadura chilena

O golpe militar havia chegado apenas ao segundo dia, quando o professor e músico Víctor Jara foi levado para o Estádio Chile. Soldados esmagaram as mãos dele com coronhadas de fuzis, o mataram com 40 tiros e abandonaram o corpo em uma favela de Santiago. Com violência e sadismo, colocavam em prática o projeto de destruir a vida e a memória dos inimigos do regime. 

Víctor era um dos nomes mais conhecidos de uma geração de artistas chilenos que viam a música como meio de transformação política e social nos anos 1960 e 1970. Com letras críticas à exploração dos trabalhadores e esperançosas sobre um futuro socialista, o movimento ficou conhecido como Nueva Canción Chilena (Nova Canção Chilena). 

Víctor Jara era um dos artistas chilenos que cantava contra a ditadura de Pinochet. Foto: Biblioteca Nacional de Chile

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Exposição traz fotos de Evandro Teixeira nos 50 anos de golpe no Chile.Os militares subestimaram o poder das canções e mensagens que o movimento transmitia. Em 2019, durante os maiores protestos que o Chile viveu desde o regime militar, milhões de pessoas saíram às ruas para exigir reformas sociais. E o legado da Nueva Canción ressurgiu com mais intensidade. Vários cartazes traziam em destaque o rosto de Víctor Jara. E uma música composta por ele se tornou o hino das multidões: El derecho de vivir em paz (O direito de viver em paz). 

Desde 2003, o Estádio Chile foi batizado com nome do músico e se transformou em um espaço de memória dos crimes cometidos pela ditadura. Também se tornou um lugar de encontro para aqueles que cobram justiça. Durante toda a segunda quinzena de setembro, está programado um festival de arte para lembrar os 50 anos do golpe e o papel da cultura na resistência ao regime. 

“A herança de Víctor Jara, Violeta Parra e tantos outros artistas segue presente na nossa sociedade e na América Latina. As novas gerações de artistas têm incorporado esse legado nas suas inspirações e criações”, disse Cristián Galaz em entrevista à Agência Brasil.

Ele é diretor executivo da Fundación Víctor Jara, que organiza o festival. 

No Brasil, também está sendo preparado um evento musical de memória e reflexão sobre a data. O Mil Guitarras Para Víctor Jara acontece no dia 30 de setembro em São Paulo, no galpão do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), bairro dos Campos Elíseos. Um dos organizadores é o grupo EntreLatinos, que tem repertório focado no canto popular latino-americano. 

“Víctor Jara representa muito para nós. Ele era um artista envolvido em diversas linguagens, nutria um profundo amor pelo seu povo, por sua terra e pela cultura popular. Não só do Chile, mas de toda a América Latina. O trabalho cultural que ele desenvolveu, visando sempre a transformação social e a valorização da nossa cultura é um legado que tentamos seguir, assim como o legado da Nueva Canción Chilena. Víctor deu sua vida por isso e não podemos deixar cair no esquecimento o quanto isso custou a ele e a milhões de pessoas no nosso continente”, disse Francisco Prandi, integrante do EntreLatinos. 

Origens do Nueva Canción 

As origens do movimento Nueva Canción Chilena podem ser traçadas a partir da vida e do trabalho de Violeta Parra. Na década de 1960, a artista plástica e cantora interpretava músicas folclóricas e as adaptava para incluir críticas sociais. Um modelo que inspiraria outros músicos. Os filhos dela também tiveram papel importante. Isabel e Ángel Parra criaram a Peña de Los Parra, uma espécie de casa noturna para artistas mais ligados ao gênero musical impulsionado por Violeta, que passou a ser frequentada principalmente por jovens e intelectuais de esquerda. 

Outro marco foi o movimento de reforma universitária no Chile em 1967, que ocorreu em diferentes instituições educacionais do país, em busca da democratização do ensino. Nesse contexto, muitos vão entender a música como meio de intervenção política na sociedade. Víctor Jara – que era professor universitário de teatro, cantor e compositor – apoiou a reforma. Estudantes também criaram grupos musicais amadores, com destaque para o Quilapayún e o Inti-Illimani. 

Violeta Parra deixou legado de ativismo político por meio da música. Foto: Biblioteca Nacional de Chile

Eles inovaram no uso de instrumentos musicais e em tocar gêneros de diferentes países da América Latina. Antes, a maioria dos intérpretes de canções folclóricas tinha abordagem mais nacionalista, voltada para a cultura do Vale Central, região de Santiago e arredores. Muitos dos novos músicos eram filiados ou próximos aos partidos de esquerda, principalmente o Partido Comunista do Chile, o que refletia diretamente nos temas e nas letras das músicas. 

“As canções nesse contexto trazem muitas questões sobre a vida dos trabalhadores. Por exemplo, sobre a situação dos mineiros. A mineração no Chile já era muito importante, principalmente de cobre e de carvão. Também havia músicas que falavam dos camponeses e a exploração dos patrões”, explica a historiadora Natália Ayo Schmiedecke.

“E existiam ainda manifestações relacionadas às tradições indígenas. Independentemente dos problemas que esses músicos abordassem, entendiam que o simples fato de resgatar canções de origem quéchua ou aymará já era uma maneira válida de se opor ao imperialismo estadunidense”. 

Ideal socialista 

Violeta Parra morreu em 1967, mas deixou como legado o ativismo político musical. Nas eleições presidenciais de 1970, muitos artistas entenderam que era preciso se posicionar e trabalhar diretamente nas campanhas. Entre os que se colocaram ao lado do socialista Salvador Allende, estavam Victor Jara, Isabel e Ángel Parra, Sergio Ortega, e os conjuntos Quilapayún, Inti-Illimani e Aparcoa. Eles participaram de comícios e gravaram canções em defesa da candidatura, que foi construída em cima do lema “Não há revolução sem canções”. 

Nesse contexto, os músicos que se identificavam com o projeto político da Unidade Popular passaram a ser identificados pelo termo “Nova Canção Chilena”. Em comum, compunham e interpretavam canções que expressavam a esperança de novos tempos por meio do socialismo. O nome já havia sido usado como título de um festival de 1969, mas passou a designar um movimento político bem definido durante a campanha e o governo de Allende. 

Com a vitória nas urnas, eles continuaram apoiando o governo por meio de novas composições, eventos e até em cargos públicos. Isabel Parra, Víctor Jara, Inti-Illimani e Quilapayún foram nomeados Embaixadores Culturais do Governo Popular. Em 1971, passaram a integrar uma secretaria da Universidad Técnica del Estado (UTE) e ganhar salários para realizar apresentações durante o ano. Uma canção bem representativa desse momento é Manifiesto, de Víctor Jara. Ele defendia a música politicamente engajada, em oposição às letras vazias de mensagens e conformadoras de opressões.

“O canto tem sentido./ Quando palpita nas veias./ De quem morrerá cantando./ As verdades verdadeiras./ Não as lisonjeiras “baratas”./ Nem as famas estrangeiras./ Mas sim uma canção popular./ Até o fundo da terra./ Aqui onde chega tudo./ E onde tudo começa./ Canto que foi valente./ Sempre será canção nova”. 

Golpe e resistência 

O golpe militar de 1973 incluiu membros da Nueva Canción entre os inimigos a serem destruídos. Uma parte deles foi vítima de tortura e assassinato, outra teve de escolher entre a clandestinidade e o exílio. 

“O regime militar censurava toda produção musical associada à esquerda. Então, o simples ato de tocar instrumentos andinos já era visto com desconfiança, era desencorajado e poderia resultar em problemas”, explica Natália Schmiedecke.

“A Nueva Canción Chilena se desmantela nesse contexto. Depois, os músicos vão ter um papel muito importante de oposição, participando de festivais de solidariedade contra a ditadura chilena no exterior. Eles viajam muito em diferentes países do mundo levando essa mensagem de resistência”. 

Ainda no final da década de 1970, um movimento de continuidade ressurgiu no Chile sob o nome de Canto Nuevo, uma referência clara ao trabalho dos artistas anteriores. Para enfrentar a censura, eram compostas músicas com sonoridades diferentes, temas menos propositivos e mais reflexivos. 

O uso de metáforas também se tornou comum para mascarar críticas ao regime militar. Uma das estratégias era falar de problemas como desemprego, desabastecimento, poluição, entre outros, que não eram explícitos contra a ditadura, mas desafiavam a narrativa oficial militar de que o país estava em ordem e prosperando. 

Canto por justiça 

Nos dias atuais, o resgate de artistas e músicas daquele período é uma forma de manter viva as utopias, a memória dos crimes da ditadura e da resistência. Mas, no campo político e jurídico, novos passos foram para punir torturadores e lideranças do regime militar que torturou e matou milhares de pessoas no país. 

Um marco importante, nesse sentido, ocorreu recentemente. Em 2018, a justiça chilena havia condenado sete ex-militares como autores dos crimes de sequestro e homicídio qualificado contra Víctor Jara e Littré Carvajal (diretor nacional das prisões na época do governo Allende). Em 2021, as penas foram aumentadas. Seis deles foram condenados a 25 anos de prisão e um a 5 anos. Os réus entraram com recursos na Corte Suprema e, no fim de agosto deste ano, tiveram os pedidos de revisão das penas negados. Um dos ex-militares se suicidou antes de ser preso. 

Em julho deste ano, um juiz da Flórida, nos Estados Unidos, retirou o direito à cidadania norte-americana do ex-tenente do Exército Pedro Pablo Barrientos Nuñez, que reside no país desde 1990. Ele é apontado como o autor material do assassinato de Víctor Jara. Na sentença, o juiz diz que Barrientos mentiu no processo de imigração, porque negou ter participado de genocídio ou homicídio, o que tornaria a cidadania dele ilegal. 

A Fundação Víctor Jara, que tem como presidenta a viúva Joan Jara, celebrou a decisão nos Estados Unidos, mas espera agora que o governo chileno faça a parte dele e peça a extradição de Barrientos, para que ele possa ser julgado no país. A organização entende que, além de honrar a memória do músico, este seria um símbolo importante de justiça para todos os torturados, mortos e desaparecidos na ditadura. Principalmente quando fantasmas do passado ameaçam retornar. 

“Vivemos um ataque feroz do negacionismo por parte daqueles que apoiaram o golpe militar, uma direita extremista que tem sido impulsionada por avanços nas suas posições em todo o mundo. Hoje mais do que nunca é preciso lutar em um campo que estará sempre em disputa: o da memória e dos direitos humanos. Estamos comprometidos com essas lutas e não estamos sozinhos neste caminho, somos milhares no Chile e no mundo. Estamos acompanhados pelo exemplo de Víctor Jara, seu legado e canções cheias de amor e vida”, disse o diretor executivo Cristián Galaz.

Agência Brasil – Read More

SP: Defensoria exige câmeras em policiais da Operação Escudo

A Defensoria Pública de São Paulo e a Conectas, organização de defesa dos direitos humanos, entraram, nesta terça-feira (5), com uma ação civil pública em que pedem que a Justiça do estado exija do governo estadual que policiais da Operação Escudo passem a usar câmeras acopladas aos uniformes. No despacho, as entidades afirmam que a justificativa que a Secretaria da Segurança Pública (SSP) apresentou para realizar a operação, como reação à morte de um policial, já caracteriza “vingança institucional” e que os moldes de atuação equivalem à de um “esquadrão da morte”.

A Operação Escudo teve início após a morte do policial Patrick Bastos Reis, das Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (Rota), da Polícia Militar, em 27 de julho. A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo tem reiterado o discurso de que as mortes ocorreram como resultado de confrontos entre as vítimas e agentes das forças policiais.

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Número de mortos na Operação Escudo sobe para 27.MPSP apura se Operação Escudo é ilegal; entidades pedem fim da ação.Homem é morto pela PM após confronto durante Operação Escudo .Na sexta-feira (1º), a emissora de TV GloboNews revelou que a bala que matou Bastos Reis era de um calibre usado exclusivamente pelas forças de segurança pública, fato que fortaleceu a tese de que a operação foi concebida como uma forma de retaliação às comunidades periféricas do litoral paulista, conforme apontou relatório do Conselho Nacional de Direitos Humanos.

Para a Defensoria Pública e a Conectas, a medida de utilização de câmeras deve se aplicar tanto a policiais militares como policiais civis de Santos e do Guarujá, escalados para a operação. Segundo as organizações que ingressaram com a ação, somente em um de 25 casos que analisaram o uso do equipamento já havia sido incorporado.

No documento, as entidades mencionam os aspectos que acreditam serem indicativos de que os policiais cometeram excessos no âmbito da operação, como a quantidade elevada de disparos que atingiram vítimas. Até segunda-feira (4), o total de mortos chegava a 27.

“Dos 25 Boletins de Ocorrência analisados, em 15 deles consta a informação sobre o número de disparos realizados. Ao total, 70 disparos atingiram as vítimas fatais, o que totaliza uma média de 4,6 disparos em cada ocorrência”, relatam a Defensoria Pública e a Conectas.

Outro indício de abusos seria o fato de que policiais teriam plantado provas de ilegalidade para incriminar pessoas inocentes. “Também há de se destacar o encontro de mochilas/sacolas que não estavam sendo efetivamente portadas pelos indivíduos [como aquelas que foram encontradas jogadas na mata ou no fundo de uma viela] e que foram, automaticamente, vinculadas a um suspeito envolvido de modo qualquer ao caso narrado no boletim de ocorrência”, detalham.

A Agência Brasil questionou a SSP sobre a ação civil pública e aguarda retorno.

* Título e linha fina alterados às 15h

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Ministério firma parceria com Meta para buscar crianças desaparecidas

O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) firmou, nesta quarta-feira (30), um acordo de cooperação técnica com a empresa Meta, proprietária das plataformas digitais Facebook, Instagram, Threads e WhatsApp, para encontrar pessoas desaparecidas.

O objetivo é ampliar e agilizar as buscas aos desaparecidos. Pelo acordo, o Amber Alerts Brasil vai emitir um alerta de emergência de desaparecimento de crianças e adolescentes até 18 anos de idade, no Facebook e Instagram, com dados e fotos da pessoa desaparecida, em um raio de 160 quilômetros (km), a partir do local da ocorrência do desaparecimento.

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ONG Rio de Paz lança documentário sobre desaparecidos.Somente de janeiro a julho deste ano, 42.272 pessoas desapareceram no Brasil, por diversas circunstâncias, o que resulta em uma média de 199 desaparecidos por dia. Porém, no mesmo período, 26.296 pessoas foram localizadas. Média de 124 pessoas por dia, com paradeiro identificado.

A iniciativa faz parte do projeto de Busca de Pessoas Desaparecidas, lançado nesta quarta-feira, em Brasília, pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública e marca o Dia Internacional das Pessoas Desaparecidas, 30 de agosto.

A nova política está dividida em três eixos: consolidação de dados, com o estabelecimento de fluxo das informações sobre o registro do desaparecimento e a classificação nacional, entre a esfera local e o Laboratório de Operações Cibernéticas/MJSP; definição de protocolos e manuais relativos ao tema; e parcerias com plataformas digitais para difusão de informações sobre os desaparecimentos.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, disse que o projeto servirá para nacionalizar as buscas de pessoas desaparecidas, sob coordenação da pasta. “Já há uma coordenação específica na Senasp [Secretaria Nacional de Segurança Pública] sobre pessoas desaparecidas. E agora, estamos aparelhando essa coordenação com condições de efetivamente trabalhar junto com os estados. E a nossa contribuição, que não é local, evidentemente, mas, nacional, é basicamente a de difusão de informações”.

Ferramenta

No Brasil, a ferramenta Amber Alerts vai postar o alerta de emergência de desaparecimento de criança e adolescentes até 18 anos de idade, no Facebook e Instagram, como dados e fotos da pessoa desaparecida, informações sobre roupas que usava quando foi vista pela última vez, dados sobre o veículo supostamente envolvido em casos de rapto ou sequestro.

A publicação nas duas redes sociais vai ser direcionada para um raio de 160 quilômetros do local de desaparecimento ou da residência da criança ou do adolescente.

Desde 1990, a tecnologia, inaugurada nos Estados Unidos, já foi experimentada em 30 países e seu uso permitiu encontrar cerca de 1.200 crianças, de acordo com a diretora global de Responsabilidade e Segurança da Meta, Emily Vacher.

O ministro Flávio Dino disse que o fluxo do trabalho de comunicação do desaparecimento será a partir das análises de risco feitas pelas secretarias de Segurança Pública dos estados e repassadas ao ministério. “Haverá um fluxo em que as delegacias dos estados vão comunicar à Senasp, no caso ao Laboratório de Crimes Cibernéticos, e, depois, nós vamos comunicar à Meta, e a empresa fará, por seus instrumentos tecnológicos, essa postagem”.

Ampliação das buscas

Na fase inicial, apenas o Distrito Federal e os estados do Ceará e Minas Gerais farão parte do programa de emissão dos alertas pela Meta. O secretário Nacional de Segurança Pública, Tadeu Alencar, justificou a escolha das três unidades da federação, porque “esses estados já têm políticas minimamente estruturadas no trato da política de pessoas desaparecidas, e se dispuseram a fornecer os instrumentos tecnológicos, de pessoal e de logística, que são importantes para a estruturação inicial desse projeto”.

O ministro Flávio Dino prevê que, após a confirmação do êxito da política nessas três unidades da federação, a partir de janeiro de 2024 o programa terá a implantação estendida ao restante do país, conforme adesão voluntária dos governos estaduais.

“Creio que todos os estados vão participar, porque é, evidentemente, uma ferramenta muito eficiente para essa difusão de informações”, disse.

A partir da parceria firmada com o governo federal, a representante da Meta, Emily Vacher, confirmou que a empresa norte-americana trabalhará, nos próximos meses, para estender a tecnologia a outros estados. Emily Vacher revelou, ainda, que a Meta poderá estudar ampliar a aplicação do sistema a outros braços da empresa, como o serviço de mensageria WhatsApp e ao aplicativo de texto Threads.

“Espero que, no futuro, a gente possa expandir esse programa não só para o WhatsApp, mas para a nova plataforma Treads, que é uma forma muito importante de compartilhar informações. Especialmente, porque o WhatsApp é tão importante aqui, no Brasil”.

Diálogo

Dino disse que houve uma melhora no diálogo, entre abril e agosto, com as empresas donas de plataformas digitais, após as notificações feitas pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, em abril deste ano, para que as redes sociais fizessem a moderação e exclusão de conteúdos extremistas com ameaças de violência nas escolas brasileiras.

“Consideramos que [o diálogo] é um passo positivo no desfazimento desta tensão, e estabelecimento de uma parceria importante socialmente, abertura, portanto, de novos caminhos, sem prejuízo das funções do ministério. Se em algum momento houver necessidade de apuração de condutas, faremos. Mas nós desejamos que parcerias similares a essa possam se produzir com velocidade”.

A assessora especial de Direitos Digitais do MJSP, Estela Aranha ratifica o posicionamento sobre o entendimento compartilhado sobre um ambiente online seguro, entre o poder público e as big techs. “Talvez pudéssemos ter algumas divergências sobre a forma o papel de cada um. Tem toda uma discussão sobre regulação, que tem algumas divergências, mas não impede um trabalho conjunto, em especial, na área de segurança e integridade da internet e segurança pública”.

Agência Brasil – Read More

Direitos Humanos cobra apuração de ameaças ao padre Júlio Lancellotti

O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania prestou solidariedade ao padre Julio Lancellotti, após o religioso receber ameaças anônimas, que ele tornou públicas neste domingo (27). A pasta ainda manifestou repúdio à intimidação e informou que cobrou providências das autoridades de São Paulo.

O padre Julio Lancellotti mantém, na capital paulista, um projeto de acolhimento da população em situação de rua, fornecendo alimentos e itens básicos, incluindo cobertores e roupas. Em seu perfil do Twitter, Lancellotti publicou uma foto com o bilhete que recebeu. A postagem na rede social teve mais de 2,7 milhões de visualizações.

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Segundo nota do ministério, o titular da pasta, Silvio Almeida, contatou, por telefone, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, após retornar de uma viagem à África. De acordo com a pasta, o governador informou ao ministro que a polícia prontamente identificou o autor da ameaça e o encaminhou às autoridades competentes.

“Infelizmente, não é a primeira vez que o religioso é ameaçado por causa do trabalho que realiza com pessoas e grupos em situação de vulnerabilidade. É inadmissível que um homem com sua trajetória e importância social continue sendo alvo de atos criminosos por parte de quem se opõe à luta pela justiça social”, afirma o ministério.

“O MDHC se coloca à disposição para adoção de todas as medidas necessárias visando à proteção do Padre Júlio, que reconhecemos como grande defensor dos direitos humanos das pessoas em situação de rua”, disse o ministério.

Agência Brasil – Read More

CNDH apura violações na Cracolândia e trabalho escravo em SP

O presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), André Carneiro, informou nesta segunda-feira (28) que representantes do órgão estão em São Paulo, esta semana, para apurar casos de trabalho análogo à escravidão em contexto urbano e para acompanhar a população em situação de rua, em especial da área conhecida como Cracolândia, no centro da capital.

Em entrevista à Agência Brasil, Carneiro afirmou que, nesta segunda-feira, foram feitas reuniões com o Ministério Público do Trabalho e auditores fiscais do trabalho para tratar do combate ao trabalho análogo à escravidão. Ele cobrou respostas do Poder Público a respeito da exploração de trabalhadores em confecção de roupas, principalmente.

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Carneiro destacou que as equipes saíram de Brasília para verificar de perto as duas situações após receber denúncias. “A gente está indo a São Paulo justamente para ouvir o movimento e as pessoas e entender o que está acontecendo, quais foram as mudanças, se estão compatíveis com o cenário internacional”, explicou, em relação ao rumo das políticas públicas voltadas à população em situação de rua, que preocupam o movimento social de defesa desse grupo.

A Agência Brasil procurou a Prefeitura de São Paulo para se pronunciar e ainda não teve resposta.

Agência Brasil – Read More

CNDH aponta execuções da Operação Escudo; relatório sai nesta semana

O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) deve divulgar na próxima quinta-feira (31) um relatório sobre a Operação Escudo, ação da Polícia Militar em Guarujá, no litoral paulista. O documento traz relatos de “violações gravíssimas”, que envolvem execuções sumárias que teriam sido praticadas durante a operação, como antecipou à Agência Brasil, o presidente do conselho, André Carneiro Leão.

“Nós ouvimos relatos de execuções sumária. Casos de pessoas que eram conduzidas para becos, vielas, e, ali, executadas. Ouvimos relatos de mortes de pessoas inocentes, que eram trabalhadores. Ouvimos o caso de uma pessoa, em que o patrão dela relata as circunstâncias que essa pessoa teria sido morta”, revelou Leão.

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Até o momento, 22 pessoas foram mortas pela polícia durante a operação, que está em andamento e teve início após a morte do policial Patrick Bastos Reis, das Rondas Ostensivas Tobias Aguiar (Rota), da Polícia Militar, em 27 de julho. De acordo com a Secretaria de Estado da Segurança Pública de São Paulo (SSP), as mortes ocorreram em confronto de supostos criminosos contra as forças policiais.

Para o representante do órgão, a operação policial apresenta diversos problemas, a começar pelo total de mortos, o que “demonstra fracasso”.

Caixões fechados

Há ainda violações relacionadas às famílias das pessoas que morreram durante a ação. Segundo o presidente do conselho, os relatos apontam para falta de acesso a informações sobre as circunstâncias das mortes e até a impossibilidade de identificação dos corpos.

“Ouvimos alguns relatos que nos chocaram bastante em relação a forma como os familiares dessas vítimas foram tratadas logo após o fato. Tinham dificuldades de acesso à informação. Os corpos em caixões lacrados, sem a possibilidade de fazer o reconhecimento de seus familiares. Enterravam essas pessoas sem saber se, efetivamente, se tratavam de seus familiares”, acrescentou a respeito das denúncias que devem constar no relatório.

Após a coleta das informações, Leão diz que tentou, sem sucesso, se reunir com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e com o secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite, para tratar das denúncias.

“Nós vamos cobrar uma apuração rigorosa da atuação da polícia nesses casos. Estamos em contato com o Ministério Público, que é responsável pelo controle externo da atividade policial, e vamos monitorar essas investigações para que haja responsabilização daquelas pessoas que se excederam”, acrescentou.

Enquanto isso, de acordo com Leão, o conselho tem buscado formas de proteger as famílias que fizeram as denúncias. “De imediato, a nossa preocupação é com a proteção e com a garantia de direito dessas pessoas”, ressaltou.

Informações contraditórias

Uma delas é Corina*, que teve o irmão morto em uma ação classificada como confronto pelos policiais militares que registraram o boletim de ocorrência (BO).

No entanto, ela aponta diversas contradições entre a versão apresentada por esses policiais e o laudo do Instituto Médico legal (IML), em que seu irmão, além do tiro fatal recebido no queixo, estava com o fêmur e o braço quebrados devido a outros disparos. “O policial diz que ainda saiu em perseguição atrás dele e que ele ainda portava arma. E no laudo diz que o braço dele estava quebrado. Não teria como ele correr com a perna quebrada. Não teria como segurar a arma com o braço quebrado, com tiro no braço”, contou em entrevista à TV Brasil.

Além disso, Corina garante que o irmão vivia em situação de rua em São Paulo e não teria meios para chegar em Santos, onde teria ocorrido a morte.

O presidente do conselho relatou ainda sobre o caso de um homem apontado como um “grande traficante” de drogas, porém se trata de uma pessoa em situação de rua e que não tinha condições financeiras condizentes a de um criminoso com poder no mundo das drogas.

“Ele foi morto em uma comunidade completamente alheia, em um local ermo, que ele não frequentava. A própria comunidade dizia que não o conhecia daquela região, que nunca o tinha visto naquela região. E pelas próprias condições em que houve a morte e o boletim de ocorrência registrado eram incompatíveis com a vida que a família dele relatava. A pessoa em situação de miséria, sem condições de comprar nada, muito menos ser considerado um grande traficante”, disse Carneiro.

Governador defende operação

Nesta segunda-feira (28), o governador Tarcísio de Freitas defendeu a atuação da polícia na Baixada Santista.

“A gente não quer o confronto, não quer de jeito nenhum. O confronto não é desejável. Agora, a polícia também não pode ser confrontada. Ela tem que ter o respeito em fazer as suas operações como elas têm que ser feitas. Ela tem suas regras de engajamento. A nossa polícia é extremamente capaz, bem treinada e está fazendo o máximo para proporcionar a segurança pública para a população”, disse.

O governador também chamou atenção para o número de pessoas presas durante a Operação Escudo. “Desses 650 presos, 245 [eram] foragidos da Justiça. Ou seja, 245 pessoas com mandado de prisão em aberto, foragidos da Justiça, andavam tranquilamente por Guarujá e foram capturados nessa operação”, acrescentou.

Relatório elaborado pela Defensoria Pública de São Paulo e divulgado no último dia 18 mostrou que 90% das pessoas presas em flagrante durante a Operação Escudo estava desarmada. Além disso, em 67% dos casos não houve apreensão de drogas. Outro dado observado pela defensoria é que mais da metade dos detidos (55% do total) eram réus primários. 

O relatório apontou ainda que sete em cada dez pessoas que foram presas em flagrante na operação têm entre 18 e 34 anos e 60% se declaram pardas.

Nota

A Secretaria de Segurança Pública (SSP) do Estado de São Paulo emitiu a seguinte nota:

“A Operação Escudo segue para sufocar o tráfico de drogas e combater o crime organizado na Baixada Santista. De 28 de julho a 27 de agosto, 665 pessoas foram presas. Deste total, 253 eram procurados pela Justiça e estavam foragidos pelos mais diversos crimes, como tráfico de entorpecentes, roubo, furto, estelionato, até sequestro e homicídio. No período, as forças de segurança apreenderam 85 armas e 906 kg de entorpecentes, causando um prejuízo ao tráfico de drogas que já passa dos R$ 2 milhões.

Até o momento, 23 pessoas morreram em decorrência de oposição à intervenção policial. Por determinação da SSP, todos os casos de morte decorrente de intervenção policial são investigados minuciosamente pela DEIC de Santos e pela Polícia Militar por meio de Inquérito Policial Militar.”

*Matéria alterada às 9h57 do dia 29 de agosto para incluir nota da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo.

*Nome fictício para proteger a identidade da entrevistada

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Ministério da Justiça concede medalha a padre Júlio Lancellotti

O padre Júlio Lancellotti irá receber a medalha da Ordem do Mérito do Ministério da Justiça e Segurança Pública, no grau Grã-Cruz, pelas ações que promove em benefício da população em situação de rua e outros grupos minorizados, na capital paulista. Decreto que concede a honraria, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi publicado nesta terça-feira (29), no Diário Oficial da União.

A medalha homenageia pessoas que prestem serviços relevantes ao país, na área da Justiça e da segurança pública. Além de presbítero, Julio Lancellotti, de 74 anos, é coordenador da Pastoral do Povo da Rua de São Paulo e pedagogo. 

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Direitos Humanos cobra apuração de ameaças ao padre Júlio Lancellotti.“Padre Julio Lancellotti é um exemplo de brasileiro, preocupado com os direitos humanos e defensor das pessoas que mais precisam de atenção”, afirmou o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino.

Lancellotti recebeu ameaças anônimas, que ele tornou públicas neste domingo (27). A mensagem de ameaça começa e termina com xingamentos dirigidos ao padre. No bilhete, redigido à mão, o autor escreve que o padre é “defensor dos direitos dos bandidos” e “petista”. O agressor ainda o acusa de “usar o povo para se favorecer”. “Seu dia de reinado aki (sic) vai acabar, pode esperar”, diz trecho da mensagem. 

Segundo o Ministério da Justiça, o autor já foi identificado e confessou ter deixado o bilhete na porta da Igreja São Miguel Arcanjo, onde Lancellotti atua. O ministro Flávio Dino disse que a responsabilidade pela investigação cabe ao governo estadual, mas que, “de todo modo”, deve “colher mais informações e estudar medidas cabíveis” para punir o homem que intimidou e atacou Lancellotti.

Logo após Julio Lancellotti fazer a postagem, no domingo, o presidente Lula prestou solidariedade a ele, classificando as ameaças como “criminosas e inaceitáveis”.

“Um fiel seguidor dos princípios de Jesus, Padre Julio Lancellotti é uma referência no acolhimento e no cuidado de quem mais precisa, sobretudo das pessoas em situação de rua da capital. Tenho dito que não podemos tolerar a cultura do ódio no nosso país. Precisamos virar esta triste página da nossa história. Mais amor e solidariedade. Menos ódio e egoísmo. É disso que precisamos no Brasil e no mundo”, afirmou o presidente. 

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Comitiva de direitos humanos relata intimidação por agentes em SP

Uma equipe do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) que se encontra na capital paulista para apurar denúncias de violações a pessoas em situação de rua relata foi alvo de intimidações provocadas pela Guarda Civil Metropolitana (GCM), na manhã desta terça-feira (29). Segundo a conselheira Virgínia Berriel, que coordena a Comissão de Trabalho, Educação e Seguridade Social do CNDH, a investida ocorreu na região conhecida como Cracolândia e os agentes só recuaram quando a conselheira se identificou como autoridade.

“Nós não nos sentimos intimidados pela população em situação de rua, muito pelo contrário, fomos intimidados pela polícia, que, todo dia solta bomba, machuca, agride aquelas pessoas, como se elas não fossem gente. É um negócio de doer. Vieram para cima da gente e eu tive que dar ‘carteirada’. Se eu não mostrasse o cartão, eu seria presa, porque ousei tirar uma foto do policial, porque eles estavam preparando a operação para atacar aquelas pessoas”, disse ela, em entrevista à Agência Brasil

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Coletivos lésbicos fortalecem redes de mulheres nas periferias.10 perfis lésbicos para você conhecer nesse Dia da Visibilidade.Visibilidade lésbica: quando a ida ao ginecologista pode ser um trauma.A integrante do CNDH conta que, como é jornalista, já tende a deixar tudo documentado, o que explica o impulso, ao ver que as agressões estavam na iminência de se concretizar, de fotografar os agentes de segurança. Foi quando um deles a abordou e afirmou que ela não tinha o direito de fazer as fotos.  Virgínia disse que poderia tirar foto, já que estava em missão da CNDH. “Ele veio para cima da gente e eu disse: tudo bem. Se você for atacar, vai atacar o CNDH e depois vai ter que prestar esclarecimentos”.

Na sequência, o agente se afastou com a equipe do local. “Só não sei se eles vão voltar lá. Mas eles saíram do local. As pessoas que ficam ali, da assistência social, médicos, disseram: olha, vocês conseguiram uma façanha, porque eles não saem”, acrescenta Virgínia. 

A conselheira informou, ainda, que, logo depois da passagem pela Cracolândia, a comitiva seguiu para a Paróquia Nossa Senhora da Paz, na Liberdade, que desenvolve ações a imigrantes e refugiados, e cumprirá, ao longo do dia, agenda com líderes do movimento das domésticas e da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Amanhã (30), os representantes do CNDH devem se reunir com o padre Julio Lancellotti e, na próxima sexta-feira (1º), com lideranças do movimento da população em situação de rua, no Espaço Sociocultural Cisarte, na Bela Vista.

A Agência Brasil questionou a Secretaria Municipal de Segurança Urbana, a quem a GCM responde, e aguarda posicionamento.

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CNDH denuncia trabalho escravo em oficinas de costura em São Paulo

Uma comitiva do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) que viajou à capital paulista descobriu, nesta semana, a existência de cerca de 150 oficinas de costura onde trabalhadores, sobretudo de outras nacionalidades, são vítimas de trabalho análogo à escravidão. A informação, que deverá constar de relatório divulgado na próxima quinta-feira (31), foi adiantada à Agência Brasil pela conselheira Virgínia Berriel, que coordena a Comissão de Trabalho, Educação e Seguridade Social do CNDH.

A representante do conselho relatou que apurou a situação a partir de conversas, no último domingo (27), com um grupo de cerca de 120 imigrantes e refugiados da Bolívia, do Equador e da Venezuela. Há, ainda, pessoas do Paraguai e do Peru nessa condição, conforme salienta Virgínia. “As oficinas funcionam como casas. As pessoas moram e trabalham nelas. Isso é muito doído”, afirmou, em entrevista, em que sinalizou que o conselho deverá pedir apoio ao Ministério das Relações Exteriores para encontrar soluções.

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CNDH aponta execuções da Operação Escudo; relatório sai nesta semana.CNDH apura violações na Cracolândia e trabalho escravo em SP .Virgínia contou que o trabalho nas oficinas começa, geralmente, às 7h, e se estende até a meia-noite, com pequenas e raras pausas ao longo do dia, o que configura jornada exaustiva e fere os direitos dos trabalhadores. A coordenadora observa, ainda, que a maioria dos funcionários que atuam no ramo da confecção, na capital paulista, é boliviana. “E não é que eles sejam costureiros e costureiras, eles entraram nesse mercado para sobreviver. Vão aprendendo e fazendo cada vez mais.”

Pelos relatos, o CNDH apurou que os trabalhadores pagam tanto por alimentos quanto pelos banhos que cada integrante de suas famílias toma nesses locais que servem como oficina e residência. Outro aspecto destacado pela conselheira é que, mesmo quando os trabalhadores conseguem relativa libertação de suas obrigações com os empregadores, acabam optando por permanecer no segmento e na atividade, comprando máquinas de costura e abraçando a ideia de que estão empreendendo, quando, na verdade, continuam em um quadro de precariedade.

“Às vezes, até contratam outro trabalhador e aquele ciclo do trabalho análogo à escravidão vai se perpetuando. A nossa percepção é de que é uma coisa doentia, porque eles produzem cada vez mais, se culpam por não trabalhar mais. Essa jornada é normal para eles, o que é terrível para nós”, disse Virgínia.

As horas em excesso servem para eles como um parâmetro aceitável no sentido de que se sentem obrigados a cumpri-las para poder enviar dinheiro a parentes que estão em seus países de origem. Junto com isso, há o sentimento de que precisam demonstrar gratidão aos brasileiros que supostamente lhes deram uma oportunidade.

Abusos em ambiente doméstico

A situação de trabalhadores que sofrem exploração em ambientes domésticos, a ponto de configurar trabalho análogo à escravidão, também é o foco da comitiva do CNDH, que irá abordar o tema amanhã, na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), em audiência pública. Entre os trabalhadores domésticos, há o predomínio de mulheres negras.  Virgínia disse que as condições de enfrentamento em São Paulo estão comprometidas, conforme pontuou, em reunião, o próprio Ministério Público do Trabalho (MPT), que alegou contar, atualmente, com um efetivo reduzido e, portanto, insuficiente para lidar com o desafio que se impõe.

“A Justiça precisa ser mais célere na questão do trabalho análogo à escravidão, porque, às vezes, é uma vida toda dedicada a essas famílias. E tem a coisa da família, porque essas pessoas se apegam, não querem sair, por não entenderem que estão sendo escravizadas. Eles manipulam essas pessoas com o sentimento”, frisou Virgínia Berriel, acrescentando que tomou conhecimento do caso de uma doméstica que foi vítima de trabalho análogo à escravidão e morreu aos 78 anos, sem receber indenização, porque o Poder Judiciário não finalizou o processo que responsabilizaria a família que a explorou.

A Agência Brasil entrou em contato com o Ministério Público do Trabalho em São Paulo (MPT-SP), a prefeitura, o governo do estado, a Secretaria da Segurança Pública e a Polícia Federal e aguarda contato, caso queiram se manifestar.

Caso da doméstica no Brás

Nesta segunda-feira (28), o Ministério Público Federal (MPF) informou que denunciou um casal que manteve uma mulher em condições análogas à escravidão durante 33 anos, na capital paulista. A trabalhadora emendava expedientes na residência do casal e em uma loja dos dois, ambas no Brás, sem receber remuneração, nem ter descanso e outros direitos trabalhistas.

De acordo com o órgão, ela cumpria jornadas das 7h às 22h ou mais tarde e também sofreu agressões físicas e assédio moral. O casal a vigiava através de uma câmera instalada na parte do imóvel em que ela vivia. Ela conseguiu fugir em julho do ano passado, após procurar vaga de acolhimento em um centro de assistência social do município.

“A situação da trabalhadora já havia sido objeto de um acordo que os patrões firmaram em 2014, mediado pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Na ocasião, eles assumiram o compromisso de efetuar o registro em carteira da empregada, pagar salários mensais e saldar outras obrigações trabalhistas. Porém, nenhum dos deveres foi cumprido. A mulher chegou a ganhar um salário, mas, nos meses seguintes, responsabilizada pela quebra de uma máquina de lavar roupas, deixou de receber as remunerações”, escreve o MPF.

“Em depoimento às autoridades, o casal procurou eximir-se de responsabilidade afirmando que considerava a mulher uma pessoa ‘da família'”, complementa o órgão.

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Encontro em Brasília discute reparação de violações a povos indígenas

O encontro Povos Indígenas e Justiça de Transição – Memória, Verdade, Reparação e Não Repetição reuniu, nesta terça-feira (29), representantes de povos indígenas, pesquisadores, professores e estudantes, na Universidade de Brasília (UnB). O evento foi organizado pelo Instituto de Políticas Relacionais, em parceria com a plataforma virtual Armazém Memória, e contou com o apoio da Embaixada da Noruega no Brasil.

O encontro faz parte do projeto Centro de Referência Virtual Indígena. Em debate, a defesa do resgate e preservação da memória de povos indígenas; da justiça de transição, como forma de reparação das violações de direitos humanos contra os povos originários do país; a construção de mecanismos de não repetição de graves desrespeitos de direitos; e, também, a efetiva criação da Comissão Nacional Indígena da Verdade (CNIV) para a apuração, reconhecimento de responsabilidades e reparação de violações cometidas.

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Comissão aprova marco temporal para demarcação de terras indígenas.“Escrever é necessidade de resistência”, diz autora indígena.Observatório lança plataforma para proteger indígenas isolados.A diretora-geral do Instituto de Políticas Relacionais, Daniela Greeb, esclareceu o papel da organização não governamental nas lutas indígenas, na defesa dos direitos humanos destas populações. “Estamos aqui para dar apoio, como indigenistas parceiros. Os indígenas têm suas próprias lutas.” 

O líder indígena Marcos Terena durante entrevista após o encontro Povos Indígenas e Justiça de Transição – Memória, Verdade, Reparação e Não Repetição – Antônio Cruz/Agência Brasil

O líder indígena brasileiro Marcos Terena também marcou presença no encontro desta terça. “Penso que a promoção de direitos humanos dos povos indígenas tem que ser constante. O Brasil é forte porque tem mais de 300 sociedades indígenas vivendo em todos os biomas brasileiros”, disse.

“Na perspectiva de futuro, se conseguirmos, através da conscientização e do resgate da memória dos antepassados, firmar isso como política do governo brasileiro vamos andar muitos anos à frente”, acrescentou Terena, nascido em Mato Grosso do Sul.

Armazém Memória

Pela manhã, foi apresentado no evento o portal Armazém Memória, criado em 2001, que funciona como um resgate coletivo da história, em diversos assuntos. Este centro de referência virtual de pesquisas tem um acervo específico sobre os povos indígenas, com registros digitalizados de mais de 2,28 milhões de documentos e fotografias e seus desdobramentos.

O projeto criado, desenvolvido e coordenado pelo pesquisador Marcelo Zelic, morto em maio deste ano, traz, entre outros, relatos de práticas de usurpação de patrimônio; ocupação ilegal de territórios indígenas, emergências sanitárias, remoções forçadas, torturas e desaparecimentos de indígenas, sobretudo, durante a ditadura militar no Brasil. Segundo Zelic, 8.350 indígenas foram assassinados nos governos militares do período ditatorial.

Antes de falecer, Marcelo Zelic gravou um vídeo em que fala sobre este centro de referência virtual. “Não se trata de fazer tudo de novo. Trata-se de reunir para disponibilizar o acesso a essa documentação que existe dispersa no Brasil. Muita documentação indígena e indigenista, de interesse dos povos, se encontra em papel até hoje.” Na gravação, o pesquisador questiona: “Como fazer a justiça de transição, se a gente não tivesse um centro de referência virtual que se dedique a reunir, digitalizar e dispor gratuitamente a documentação na internet?”

Encontro Povos Indígenas e Justiça de Transição – Memória, Verdade, Reparação e Não Repetição, na Universidade de Brasília (UnB) – Antônio Cruz/Agência Brasil

A mestra indígena em antropologia social, pesquisadora e defensora de direitos coletivos de povos originários Braulina Aurora enaltece o trabalho do Armazém Memória. “É uma importante plataforma que traz acervo e a memória fotográfica do que aconteceu conosco, os povos indígenas do Brasil. Tudo pode ser acessado neste processo de resgate coletivo da história.”

A pesquisadora Fernanda Kaingáng, a primeira mestre indígena em direito, pela UnB, falou sobre a ferramenta virtual disponibilizada gratuitamente. “O Armazém Memória é uma ferramenta de luta, de pesquisa […] Nós temos milhões de informações à nossa disposição. E nossos povos estão esperando a reparação.”

Homenagem

Na abertura do encontro, os presentes homenagearam Marcelo Zelic, falecido em maio deste ano, com falas, canto, fotos, vídeos e manuscritos.

O pesquisador indígena Mairu Karajá recordou-se do companheiro de trabalho. “Nestes três anos de pesquisa, Marcelo acreditou e fortaleceu em cada um de nós. Todas as pessoas que chegaram ao projeto, nós, primeiramente, depois os outros que vieram, Marcelo sempre plantou uma semente de esperança e de confiança na gente, para a gente confiar na nossa história, na nossa competência como indígenas.”

O legado do pesquisador também foi lembrado por Fernanda Kaingáng. “Marcelo lutava por direitos humanos. Ele denunciava os crimes do Estado brasileiro, o qual deveria nos proteger e não protegeu. E que continua violando nossos direitos todos os dias.”

Julio Zelic, filho do pesquisador, que desde seus 17 anos contribui nas pesquisas e arquivamento do acervo do Armazém Memória, falou sobre o material resgatado pelo pai e outros pesquisadores indígenas e indigenistas. “Esse passado nunca é algo do esquecimento. Ficamos bem com o próprio tempo, quando percebemos que o passado é a certeza de quem a gente é, das nossas raízes, ancestralidades e que é assim que construímos nossa própria ética.”

Outras atividades do encontro

Complementando a parte documental, a representante do Instituto de Políticas Relacionais Daniela Greeb, destacou a apresentação, no encontro desta terça-feira, da coleção Indígenas pela Terra e pela Vida, com 48 entrevistas de lideranças indígenas. Para Daniela Greeb, o objetivo é fortalecer a história oral, contada pelos próprios indígenas. “A história oral, junto com essa documentação documental, vai ser bem bacana para dar apoio à [futura] Comissão Nacional Indígena da Verdade.”

Como parte do encontro, serão plantadas 158 árvores no Santuário dos Pajés, na terra indígena que se encontra dentro de uma área de expansão imobiliária (Setor Noroeste), em Brasília.

Também foram lançados dois livros com a temática dos povos indígenas: Reportagens Especiais Infoamazonia, de Gabriel Fonteles e Stefano Wrobleski, e Demarcar É Reparar: Olhar Indígena sobre a Justiça de Transição no Brasil

Agência Brasil – Read More