A perda de peso tornou-se prioridade para o tratamento do Diabetes Tipo 2. A nova orientação de conduta clínica está sendo colocada pela primeira vez como medida que antecede a redução nos níveis de glicemia para o sucesso no controle do diabetes tipo 2.
A informação começou a ser divulgada, no início do mês de junho, durante o 82nd Scientific Sessions of the American Diabetes Association, realizado no Estados Unidos, onde a Sociedade Americana de Diabetes e a Sociedade Europeia propuseram um novo algoritmo, orientando que o tratamento da obesidade deve ser o primeiro passo para o tratamento do diabetes tipo 2 e, consequentemente, para reduzir os índices glicêmicos.
Um novo algoritmo significa rever as diretrizes que irão guiar o tratamento de uma doença, principalmente de doenças crônicas como diabetes tipo 2.
Os algoritmos – revisados anualmente – regulam desde o tratamento nos consultórios e chegam até a revisão de políticas públicas para o tratamento do diabetes tipo 2. Isso inclui o passo a passo dos cuidados, como será a infraestrutura, a ordem de preferências medicamentosas e a indicação cirúrgica.
Uma série de estudos e pesquisas direcionaram a nova diretriz publicada na revista científica JAMA Clinical Review & Education neste mês.
A proposta também deverá chegar ao Brasil neste ano e integrar os algoritmos da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD).
Além do tratamento clínico convencional, que prevê dieta, atividades físicas, terapia comportamental e medicamentos para controle da obesidade e do diabetes, a Sociedade Americana de Diabetes também passou a recomendar a cirurgia metabólica para pacientes que não alcançam perda de peso duradoura ou melhora das comorbidades com métodos não cirúrgicos.
“Vários ensaios clínicos randomizados mostraram melhorias maiores no controle glicêmico com tratamento cirúrgico versus tratamento médico. Uma metanálise de coorte pareada e estudos prospectivos controlados mostraram menor mortalidade por todas as causas com cirurgia metabólica, especialmente em indivíduos com diabetes preexistente”, aponta a diretriz.
De acordo com o presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM), Dr. Fábio Viegas, a relação entre o excesso de peso e o diabetes tipo 2 é clara e já conhecida pela medicina e comunidade científica.
“A obesidade é uma doença crônica e multifatorial. Quanto maior for a quantidade de gordura corporal de um paciente, maior será a resistência insulínica e por consequência haverá um aumento dos níveis de glicose no sangue. Isso pode levar ao diabetes tipo 2 e agravar os casos em que a doença já é pré-existente. Por isso a perda de peso é tão importante para o controle do diabetes”, afirma Viegas.
Embasamento científico
A nova diretriz da Sociedade Americana de Diabetes, que também será incorporada pela Sociedade Europeia de Diabetes, foi baseada em um estudo publicado no The Lancet, uma das mais importantes revistas científicas do mundo e que apontou um efeito importante no controle do diabetes tipo 2, induzindo a remissão em grande parte dos pacientes e melhora considerável do estado metabólico a partir de uma perda de 15% de peso.
“É hora de considerar mudar o foco do tratamento para pacientes com diabetes tipo 2 da atual abordagem glicocêntrica reativa para abordar a obesidade, o principal fator da resistência insulínica. […] As evidências sustentam que a perda de peso pode reverter fundamentos fisiopatológicos do diabetes tipo 2. Atingir e manter uma perda de peso ideal de 15% deve ser a meta inicial do tratamento para um conjunto considerável de pessoas com diabetes tipo 2”, dizem os pesquisadores.
O artigo do The Lancet contou com a participação do Dr. Ricardo Cohen, ex-presidente da SBCBM, além de pesquisadores dos EUA, Austrália e Irlanda. “Esta é a primeira vez que a perda de peso é mencionada como passo inicial no tratamento do diabetes tipo 2 para que depois haja redução na glicemia, ou seja, o emagrecimento foi apontado como a principal ferramenta para interromper a evolução da doença a longo prazo”, afirma o Dr. Ricardo Cohen.
Obesidade e Diabetes no Brasil
No Brasil, a obesidade aumentou 72% entre 2006 e 2019, saindo de 11,8% para 20,3%, segundo a Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel). O excesso de peso (IMC igual ou maior que 25) está presente em 55,4% dos brasileiros.
Com relação à diabetes, o Brasil é o sexto país em incidência da doença no mundo e o primeiro na América Latina. São 15,7 milhões de pessoas adultas com esta condição, e a estimativa é que, até 2045, a doença alcance 23,2 milhões de adultos brasileiros. Cerca de 90% dos casos de diabetes no mundo são do Tipo 2, que está relacionado com o excesso de peso e resistência à insulina, segundo a Federação Internacional de Diabetes.
Pessoas com diabetes tipo 2 precisam de acompanhamento com especialista e medicação para estimular o pâncreas a produzir insulina e diminuir a absorção de carboidratos (que o organismo converte em açúcar). A insulina também pode ser indicada e todos os tratamentos estão disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS).
Cirurgia metabólica
Como acontece com qualquer tratamento médico, alguns pacientes podem não responder como esperado. Nesses casos, a cirurgia metabólica pode ser necessária para prevenir a progressão da doença e as consequências do diabetes. No Brasil, o Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou o tratamento cirúrgico do diabetes tipo 2 em 2017, com critérios de indicação para falha de tratamento e obesidade leve com índice de massa corporal (IMC) entre 30 kg/m² e 34,9 kg/m².