Novembro Azul: o exagero do diagnóstico

Beny Schmidt * – Para espanto dos leigos e de muitos colegas profissionais da área da saúde, a atenção que tem sido dada ao adenocarcinoma de próstata é indevida. Já dizia o maior patologista do Brasil, Walter Edgard Maffei, que em quase 50% dos casos de homens que se submeterem a uma biopsia de próstata após os 50 anos da idade, o patologista será academicamente obrigado a laudar adenocarcinoma de próstata. Isso porque, próximos de se tornarem idosos, é comum os homens apresentarem atipias nucleares nas glândulas prostáticas.

logo-saudehomem-finalIsso não significa, porém, que esse adenocarcinoma será biologicamente maligno. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. É preciso que a população conheça o ponto de vista da Scientific American, em artigo publicado em 2014. Um tumor benigno, como, por exemplo, um lipoma, constituído por células adiposas, é benigno histologicamente. Porém, se estiver localizado no cérebro e obstruir o fluxo liquórico, torna-se maligno biologicamente.

Ou seja, nem tudo que é maligno histologicamente cursa com malignidade durante a vida. Após este artigo, os americanos simplesmente aboliram em varias cidades dos Estados Unidos o screening para o diagnóstico de câncer de próstata. Por que, dizem eles? Primeiro porque a imensa maioria não se comporta como um tumor maligno. Segundo, o que é mais estarrecedor, é que quando o indivíduo tem câncer de próstata e metástase, ele morre antes de ser submetido à cirurgia, por conta da piora na qualidade de vida. Ora, pra que diagnosticar se a cirurgia não tem o efeito curativo assim propagado pelos médicos? Isso sem falar nos efeitos colaterais que, na grande maioria dos casos, cursam com a impotência sexual, tão temida pelos homens.

Quero deixar aqui a minha opinião, como patologista: não se pode operar um adenocarcinoma de próstata diretamente após o seu diagnóstico. É preciso esperar para ver o seu comportamento biológico. Há um exagero nos procedimentos cirúrgicos. Há uma intimidação dos homens e uma mistura com discussão filosófica quanto ao toque retal, que, realmente, é muito menos importante do que o bom senso e a boa prática da medicina.

 

* Beny Schmidt é chefe e fundador do Laboratório de Patologia Neuromuscular e professor adjunto de Patologia Cirúrgica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Ele e sua equipe são responsáveis pelo maior acervo de doenças musculares do mundo, com mais de doze mil biópsias realizadas, e ajudou a localizar, dentro da célula muscular, a proteína indispensável para o bom funcionamento do músculo esquelético – a distrofina.

Beny Schmidt possui larga experiência na área de medicina esportiva, na qual já realizou consultorias para a liberação de jogadores no futebol profissional e atletas olímpicos. Foi um dos criadores do primeiro Centro Científico Esportivo do Brasil, atual Reffis, do São Paulo Futebol Clube, e do CECAP (Centro Esportivo Clube Atlético Paulistano).

Foi homenageado pela Câmara Municipal de São Paulo com a entrega da Medalha Anchieta e do Diploma de Gratidão da Cidade de São Paulo, como agradecimento por todos os seus feitos em prol da saúde.  Seu pai, Benjamin José Schmidt, foi o responsável por  introduzir no Brasil o teste do pezinho.