Propósito do governo é privatizar, ainda neste ano de crise, quatro estatais: Correios, Eletrobras, Porto de Santos e PPSA, operadora do pré-sal. Outra meta é vender ações da Caixa Seguridade. Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae) afirma que venda do patrimônio público agravará situação socioeconômica, com aumento do desemprego
O ministro da Economia, Paulo Guedes, voltou a afirmar que o governo pretende se desfazer do controle de bancos e empresas públicas. De acordo com o “Posto Ipiranga” de Bolsonaro, apelido atribuído ao ministro, quatro grandes privatizações estão sendo programadas para ocorrerem ainda este ano: Correios, Eletrobras, Porto de Santos e a Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA), empresa da União que opera sob regime de partilha e é responsável pela comercialização de petróleo e gás natural. Também está no radar do Executivo a abertura de capital da Caixa Seguridade, braço de seguros e previdência da Caixa Econômica Federal e o quarto maior grupo segurador do país.
A intenção do governo de levar adiante os planos de privatização do patrimônio público é contestada pela Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae) e por outras instâncias representativas dos bancários. Segundo as entidades, há fortes indícios de que esse processo possa ser conduzido de forma irregular. “A incompetência desse governo não tem precedentes na história republicana recente do país”, afirma o presidente da Fenae, Sérgio Takemoto. “Combinada com o fatiamento da área de seguros e de outros setores lucrativos da Caixa — como loterias e cartões — a venda deste patrimônio agravará ainda mais a crise econômica que o Brasil atravessa, pois levará a um aumento do desemprego e ao fim de políticas públicas que contribuem para o desenvolvimento socioeconômico”, ressalta Takemoto.
O anúncio do que se pode classificar como “desmanche” de parte significativa das estatais ocorreu em reunião do Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), nesta última semana, sob a coordenação de Paulo Guedes, com a mesma alegação: fazer caixa neste ano por conta da paralisia na economia brasileira, situação agravada pela crise do coronavírus.
O processo de privatização, entretanto, não depende apenas do governo. “Como a legislação prevê que a venda de ativos seja autorizada pelo Congresso Nacional, a equipe econômica faz estardalhaço na mídia, apesar de não ter a mínima garantia sobre o apoio de parlamentares à proposta”, observa o presidente da Fenae.
Segundo Takemoto, a mobilização contra a privatização da Caixa, do Banco do Brasil, da Eletrobras — a maior do setor elétrico da América Latina — e dos Correios precisa ser intensificada. “São as empresas públicas que possibilitam ao governo adotar medidas anticíclicas”, analisa. “Por isso, o envolvimento dos trabalhadores e da sociedade em geral é urgente. Ou nos mobilizamos ou vão entregar o nosso patrimônio”, acrescenta.
INVESTIMENTOS PÚBLICOS — Conforme lembra o presidente da Fenae, o crédito oferecido pelos bancos públicos abastece a economia, cria empregos e produz renda para a população, além de ser um estímulo aos municípios que precisam de investimentos. Takemoto ainda ressalta que a Caixa é fundamental para o pagamento dos benefícios sociais que mantém a atividade econômica e, consequentemente, evitam o desemprego em setores de produção.
“Está muito claro que o atual governo quer acabar com o setor público. Em relação à Caixa, querem vender a área de seguros até o fim do ano, como fizeram com a Loteria Instantânea Exclusiva (Lotex), a “raspadinha”, em 2019. E estão de olho nos segmentos de habitação e cartões, além da gestão do FGTS. Querem fatiar o banco, o único 100% público do país. Não podemos permitir, porque o Brasil precisa da Caixa e de outras estatais fortes, inteiras e a serviço do povo brasileiro”, afirma o presidente da Fenae.
MOBILIZAÇÃO — Contrárias a esta agenda de privatizações, a Fenae e outras entidades representativas dos bancários da Caixa lançaram a campanha “Parem de vender o Brasil”. A iniciativa alerta para os prejuízos que a privatização das estatais poderá trazer ao país.
A campanha também fortalece o Projeto de Lei 2.715/2020, que suspende as privatizações até 2022. O PL — de autoria do deputado Enio Verri (PT/PR) e das deputadas Perpétua Almeida (PCdoB/AC), Fernanda Melchionna (Psol/RS) e Joenia Wapichana (Rede/RR) — embarga a venda de bancos e empresas públicas até um ano após o fim do estado de calamidade pública causado pela pandemia (que vai até dezembro deste ano).
Sérgio Takemoto lembra que a aprovação do PL 2.715 não interessa apenas aos trabalhadores, mas a toda a população. E destaca: “O Sistema Único de Saúde (SUS) e a Caixa Econômica Federal — com o compromisso de efetuar o pagamento do auxílio emergencial de R$ 600 — têm-se mostrado imprescindíveis para atender quem mais precisa”.
Na prática, o projeto de lei proíbe até 2022 todos os processos de desestatização e desinvestimentos, inclusive a alienação de ações que repercutam em perda do controle acionário, realizadas pela administração pública. Os autores da proposição alegam que o governo federal não só mantém os processos de venda em andamento como tem buscado agilizá-los. Três empresas públicas são citadas como exemplos na justificativa ao projeto: a Petrobras, a Eletrobras e a Caixa, cuja venda das subsidiárias nas áreas de seguros, cartões e loterias integra um movimento “afoito e irresponsável”.
“AÇÃO INSENSATA” — De acordo com os autores do PL 2.715, no âmbito do sistema financeiro, essa ação do Ministério da Economia é “suicida e insensata”. “É uma tentativa de realizar um ‘fast track’ cercado de indícios de irregularidades, descumprimento de normas e situações de conflito de interesses, sem a autorização legislativa necessária”, afirmam. E acrescentam: “Sem a perspectiva real de efetivação da venda de ativos, a Caixa e outras estatais têm realizado despesas com a contratação de consultorias, escritórios de advocacia, formação de sindicato de bancos, entre outras iniciativas nocivas e que vão gerar relevantes prejuízos para a União”.
Conforme lembra Sérgio Takemoto, desde meados de janeiro — quando o primeiro caso da Covid-19 foi notificado no país — o posicionamento do ministro Paulo Guedes e de outros segmentos do governo, ao sinalizarem o propósito de acelerar as políticas privatistas, contraria o importante papel social que a Caixa está realizando especialmente durante a pandemia. “O banco, além de pagar o benefício de R$ 600 para mais de 50 milhões de cidadãos — quantidade que pode chegar a 100 milhões de pessoas, metade da população brasileira — ainda oferece diferentes linhas de crédito para socorrer setores afetados pelos impactos econômicos da crise”, destaca o presidente da Fenae.