Mesmo com o início da retomada das atividades há alguns meses, muitos ainda podem ser acometidos pela Síndrome da Cabana
O Brasil já registra cerca de 6 milhões de casos de coronavírus. Em um cenário incerto, com a possibilidade do país estar no início de uma segunda onda da doença, muitas pessoas precisaram voltar às suas atividades externas, devido aos planos de flexibilização implementados por diversos estados, como é o caso de São Paulo que faz essa retomada controlada desde junho e que anunciou, nesta segunda-feira, 30 de novembro, que colocará novamente todo o estado na fase amarela do plano de flexibilização econômica. Mesmo assim, o medo de sair de casa se faz presente, sendo relacionado, inclusive, com um fenômeno chamado Síndrome da Cabana.
Sabrina Amaral, psicoterapeuta da Epopeia Desenvolvimento Humano, diz que ao observar os aspectos psico-comportamentais da pandemia, aumento da ansiedade e medo de sair de casa são só algumas das sequelas emocionais que assolam a população, é o que revela a pesquisa conduzida pela Universidade de São Paulo. Os níveis de medo aumentaram e 86,5% das pessoas reduziram a exposição e o contato por receio do contágio, 88,8% temia sair para ir ao mercado e 62,5% se sentia diariamente mais ansiosa.
O que é esse fenômeno que causa o medo de sair de casa?
Esse sentimento de angústia e receio que pode tomar conta das pessoas mediante à ideia de sair às ruas e retomar o contato social está relacionado a Caban Fever ou traduzido para o português Síndrome da Cabana. Esse fenômeno teve seus primeiros relatos no ano de 1900, quando moradores do extremo norte dos EUA passavam longos períodos em isolamento por conta do inverno rigoroso e, depois, tinham receio de retomar o contato com a civilização. O mesmo efeito é observado em outras situações de isolamento de longa duração: expedições no Alasca, períodos longos de hospitalização, encarceramento prolongado e em casos de pandemias.
Por que isso acontece?
É como se o nosso cérebro ficasse condicionado a vincular ‘estar seguro’ com ‘estar dentro de casa’; afinal, nós forçamos uma situação de isolamento social prolongada que já passa a marca dos 8 meses. Então é muito natural que a nossa mente dispare gatilhos de alerta cada vez que precisamos sair de casa, afinal, ainda estamos no meio da pandemia e expostos ao risco de contágio. Além disso, tivemos algumas recompensas e estímulos positivos que reforçaram o nosso comportamento de estar em casa: menos tempo no trânsito, mais qualidade de vida, mais tempo para a família, hobbies, estudo e tempo para nós mesmos. Para as pessoas que já apresentavam tendências a um perfil mais ansioso ou que experenciavam picos de estresse, a possibilidade de desenvolver os sintomas é ainda maior.
Mas isso é uma doença?
Definitivamente não. Vamos deixar bem claro que isso é um fenômeno da mente resultado de todas as intempéries e adversidades as quais estamos vivendo. Apesar do ‘apelido’ isso não é uma síndrome como por exemplo a Agorafobia, trata-se de uma realidade psicológica temporária, afinal, ainda temos o vírus circulando e temos que nos cuidar.
Quais são os sintomas?
O sintoma principal é a angústia de sair de casa, acompanhada de medo e ansiedade. Percebe-se ainda uma certa letargia, falta de motivação, sono excessivo e comportamentos de esquiva para fugir do problema, como compulsão alimentar ou adicções. Podemos notar também sintomas cognitivos como falha na memória e dificuldade de concentração.
Diante dos altos índices, a UCSI University, na Malásia, criou uma escala para aferir a incidência da chamada Cabin Fever na população. Ela foi traduzida para o português e pode ser baixada neste link.
Quais são as dicas para lidar com esse fenômeno?
1- Tome consciência do problema
É muito comum as pessoas entrarem em negação e categorizarem o seu medo como algo ‘normal’. Contudo, se você observa que este medo começa a impactar a sua qualidade de vida, sua saúde e seu emocional é preciso cuidar para que o quadro não evolua para algo mais sério como Síndrome do Pânico, Agorafobia, Fobia Social, dentre outros.
2- Adestrando o cérebro
Nosso cérebro dispara gatilhos de ansiedade como um mecanismo de autopreservação. É uma mensagem de que algo ameaçador está no ar e, por isso, é importante ficar alerta. Mostrar para a sua mente que você tem o controle da situação vai acalmar os pensamentos, portanto, liste pequenas ações que você pode tomar para mostrar que está no controle. Essas ações devem ser direcionadas a mitigar o medo e podem ser coisas simples como não usar dentro de casa os mesmos calçados que você usou para sair, manter um protocolo de higienização na porta de entrada, dentre outras.
3- Terapia de Exposição
A Terapia de Exposição é uma técnica da Terapia Cognitivo Comportamental usada para dessensibilizar o medo. Primeiro é preciso você fazer uma escala avaliando seu nível de medo e ansiedade em situações de exposição. Exemplo: Pegar o elevador = 20% x Ir ao mercado = 90%. Em seguida você planeja exposições crescentes e gradativas, dando-se pequenas recompensas cada vez que atingir ou superar os sintomas.
4- Vigie seus pensamentos irracionais
Tudo começa no pensamento. Aquilo que você pensa vai desencadear determinadas emoções. As emoções vão determinar o seu comportamento. E o seu comportamento vai definir seus resultados. Por isso é importante estar atento aos pensamentos ruminantes negativos e as crenças irracionais que são alimentadas pelas Fake News. Se perceber o turbilhão de pensamentos invadir a mente, use técnicas de respiração, repita para si mesmo que está tudo bem e assuma o controle.
5- Procure ajuda profissional
A Síndrome da Cabana pode vir acompanhada de uma outra sequela emocional da pandemia: a Coronafobia. Trata-se de um comportamento fóbico a tudo o que diz respeito à pandemia e a covid-19. E acaba sendo a porta de entrada para doenças psicológicas severas como Depressão, TAG (Transtorno de Ansiedade Generalizada), TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo), TEPT (Transtorno de Estresse Pós Traumático), Síndrome do Pânico; isso só para citar as mais conhecidas.
Não espere chegar no seu limite, para pedir ajuda, portanto, se você observar que os comportamentos de esquiva não regridem ou aumentam conforme os dias vão passando, busque um profissional. Poucas horas de terapia podem poupar a você meses de sofrimento.
Qual o seu conselho final para as pessoas que já estão vivenciando a flexibilização?
A segunda onda da pandemia já assola países da Europa e muitos deles retomaram os lockdowns para refrear o contágio. Novas ondas da doença podem sim chegar ao Brasil, isso sem mencionar a possibilidade de mutações do vírus. A lição aprendida é: não relaxe os cuidados básicos na hora de sair de casa. Todos sabemos o que é preciso fazer: usar máscaras, evitar aglomerações, manter distância segura nos espaços públicos e cuidar de você! Ainda não temos uma vacina, também corremos o risco de ter novos isolamentos sociais forçados, por isso, é crucial manter sua saúde mental e integridade psicológica. Só assim você passará por esta pandemia emocional oculta, mantendo sua vida equilibrada tanto para você quanto para aqueles que ama.
Sabrina Amaral é psicoterapeuta, psicóloga e hipnoterapeuta Omni, practitioner em PNL e coach da mente. Membro IBHEC (International Board Of Hypnosis Educational & Certification). Pós-graduada em Gestão Estratégica de Pessoas, especializou-se em Transe Conversacional com Elisabeth Erickson, Neurociência aplicada ao comportamento humano e Psicologia Positiva.
Embaixadora da Rede Mulher Empreendedora em Campinas e voluntária na Humanitarian Coaching Network que provê serviços de coaching para líderes da ONU e UNICEF. Sabrina acredita na transformação do ser humano e, após uma vivência de duas décadas na gestão de processos de RH, fundou a Epopéia Desenvolvimento Humano que se propõe a levar à tona o que o cliente tem de melhor com o intuito de ajudá-lo no processo de se tornar pleno, inteiro e feliz.