A doença, caracterizada pelo acúmulo de gordura no figado, já atinge 20% da população do mundo. Os principais motivadores do distúrbio são o excesso de ingestão de carboidratos refinados e açúcar

Quando o assunto é problema de saúde ocasionado por dieta alimentar precária – que normalmente se caracteriza por ser rica em calorias e pobre em nutrientes -, logo se pensa em obesidade, diabetes, síndrome metabólica, doenças cardíacas etc. Uma condição esquecida, mas que vem se tornando muito preocupante, é a esteatose hepática, distúrbio que se define pelo acúmulo de gordura no interior das células do fígado (hepatócitos).

Conforme o médico endocrinologista, diretor científico de Medicina da Associação Brasileira LowCarb (ABLC), Rodrigo Bomeny, trata-se de uma doença preocupante pois, se o aumento de gordura dentro dos hepatócitos for constante e durar muito tempo, é grande o risco de causar inflamação, que pode evoluir para quadros piores como hepatite gordurosa, cirrose hepática e até câncer.

Bomeny explica que existem dois tipos de esteatose hepática: a alcoólica, em que o acúmulo de gordura é provocado por excesso de álcool; e a não alcoólica, em que a pessoa com o distúrbio não tem histórico de ingestão significativa de álcool. Neste caso, entre as principais causas do distúrbio estão a alimentação rica em carboidratos refinado e açúcar. Normalmente, a doença está atrelada a outros males como obesidade, síndrome metabólica e diabetes tipo 2.

Segundo o médico, diretor-presidente da ABLC, José Carlos Souto, isso se explica porque a esteatose hepática é ocasionada pela conversão do excesso de glicose e frutose em triglicerídeos no fígado. “Se a conversão excede a capacidade do fígado de exportá-lo, eles acumulam-se nos hepatócitos”, diz. Nesse sentido, quanto menos carboidratos uma pessoa ingerir, menor será a tendência de ela acumular gordura no fígado, gerando a esteatose não-alcoólica.

Fica mais evidente, dessa forma, como pode ser importante a prática alimentar low carb no tratamento dessa doença que já atinge 1/3 de dos adultos norte-americanos e 20% da população em geral. Conforme Souto, uma estratégia que consiste em ter uma alimentação rica em proteínas e boas gorduras e pobre em carboidratos só pode ser benéfica para o combate de um distúrbio causado pelo excesso de glicose e frutose no sangue.

De acordo com Souto, variados estudos feitos em animais e humanos indicaram o benefício da restrição de carboidratos e do aumento de proteínas em relação a doenças hepáticas, particularmente à esteatose. Em um deles, publicado em 2009, no periódico biomédico The American Journal of Clinical Nutrition, voluntários humanos foram introduzidos a uma dieta com alto consumo de frutose por sete dias. Após esse curto período, constatou-se que os participantes do experimento haviam desenvolvido esteatose hepática, assim como gordura nos músculos e resistência à insulina no fígado, especialmente em pessoas com histórico familiar de diabetes.

Outros estudos compararam a eficácia de diversas práticas alimentares no combate à esteatose hepática. Um estudo publicado no JAMA em 2019 randomizou meninos entre 11 e 16 anos com esteatose hepática para uma dieta americana padrão versus uma dieta sem açúcares livres. Em apenas 8 semanas, os exames de sangue e a ressonância magnética indicaram redução significativa no grupo que restringiu o açúcar. EM 2018, outro artigo, publicado no periódico Cell Metabolism, indicou que a esteatose reduz-se significativamente em apenas 14 dias de uma dieta muito pobre em carboidratos, mesmo quando não há restrição calórica nem perda de peso. A superioridade da estratégia low carb em relação à dieta de pirâmide alimentar – em que 60% das calorias vêm de carboidratos – é evidente nesse sentido, segundo o diretor-presidente da ABLC. Na comparação com a dieta hipocalórica, a prática alimentar low carb também leva vantagem. O diretor-presidente da ABLC cita estudo publicado, em 2011, no The American Journal of Clinical Nutrition, em que pacientes obesos com esteatose hepática foram divididos em dois grupos: com restrição calórica e com restrição de carboidratos, em que o consumo diário fora reduzido para 20g. “Ambos os grupos perderam peso, mas os que aderiram ao low carb obtiveram uma melhora mais significativa no fígado, além de não passarem fome”, afirma.

Para Souto, o que se depreende dos estudos citados e da pesquisa na área de uma forma geral é que, ao diagnosticar um paciente com esteatose hepática, não se pode oferecer-lhe como tratamento uma dieta baseada na pirâmide alimentar. Ou seja, carboidratos devem ser evitados, especialmente açúcar. De acordo com o diretor-presidente da ABLC, baseado na totalidade da literatura médica, a estratégia alimentar ideal para evitar e tratar a doença é a low carb (com baixo carboidrato), composta de comida de verdade, com uma quantidade adequada de proteínas, sem a necessidade de evitarem-se as gorduras naturais dos alimentos, e pobre em gorduras poliinsaturadas (óleos vegetais).