O caso de uma portadora de glaucoma levado pela Defensoria Pública do Rio ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília, tornou mais evidente o debate sobre o cabimento de pedidos judiciais para o fornecimento gratuito de medicamentos fora das listas, protocolos e programas do Sistema Único de Saúde (SUS).

– O STJ já decidiu que o fornecimento de medicamentos independe da lista do SUS, mas não há regulamentação sobre os requisitos para tal, o que faz com que cada pedido demore para ser julgado, passando por várias instâncias. A situação concreta dessa senhora deu origem a um “recurso repetitivo”, pois fez com que fossem definidos os parâmetros para o fornecimento de medicamentos de itens fora da lista.  No futuro, os ministros irão decidir se a regra aplicada a esse caso deve ser geral e válida para todas demais ações de fornecimentos de medicamentos contra a União, estados e municípios de todo o país –, explica o defensor público Pedro Carriello, que atua junto ao STJ e ao Supremo Tribunal Federal.

No último dia 27, Carriello representou a paciente em sustentação oral no STJ e argumentou que o fornecimento de medicamentos pelo SUS está amparado no princípio da “integralidade, universalidade e equidade do acesso à saúde”, previsto na Constituição. Portanto, a lista deve ser apenas “diretiva”, e não “impeditiva, limitadora”.

– O médico pode entender que, para determinado paciente, é indicado um medicamento não contemplado pela lista do SUS. Questões orçamentárias, o que se conhece como reserva do possível, não podem prevalecer sobre bens mais valiosos como a saúde e a vida – prossegue o defensor público.

A paciente já havia conseguido, em 1ª instância e junto ao Tribunal de Justiça do Rio, decisões favoráveis ao fornecimento de dois colírios não inseridos na lista do SUS. O Estado, porém, recorreu ao STJ, onde o relator do caso, ministro Benedito Gonçalves, votou com a Defensoria, em favor da portadora de glaucoma. O voto foi seguido de pedido de vistas.

No voto, o ministro reiterou que é obrigação do Poder Público fornecer medicamentos indispensáveis não previstos em atos normativos do SUS, contanto que cumpridos requisitos específicos, como apresentação de laudo médico, insuficiência financeira do paciente para compra por meios próprios e se trate de substância com registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Ao especificar as condições de “necessidade e imprescindibilidade” para deferimento de pedido de medicamento fora da lista do SUS, o ministro suscitou o chamado “recurso repetitivo”, que será apreciado pela Primeira Seção do STJ, em data ainda não definida. Dessa forma, o caso da senhora que sofre de glaucoma pode servir de marco, com o estabelecimento de requisitos específicos, para todos os pedidos de remédios não previstos em atos normativos do SUS.

– Neste momento, é de fundamental importância que o Superior Tribunal de Justiça reafirme as balizas para o julgamento de demandas de saúde consolidadas pelo Supremo Tribunal Federal, firme no sentido de que o Estado deve fornecer medicamentos não incorporados ao SUS quando esses forem a única alternativa terapêutica eficaz para o controle da doença e manutenção da saúde e da vida do paciente – explica a coordenadora de Saúde e Tutela Coletiva da Defensoria do Rio, Thaisa Guerreiro.

Para a defensora, é preciso garantir aos pacientes do SUS acesso a medicamentos já utilizados na rede privada.

– Como bem ressaltou a Corte Maior, se, de um lado, as listas e protocolos buscam orientar os gestores na aquisição e dispensação de medicamentos, como forma de promoção do seu uso apropriado, de outro, a aprovação de novas indicações terapêuticas, além de depender de ação judicial, pode ser muito lenta, acabando por excluir o acesso de pacientes do SUS a tratamento há muito prestado pela iniciativa privada. Nesses casos em que há nítida violação ao princípio da igualdade, o Poder Judiciário precisa intervir pata restaurar a situação de constitucionalidade e Justiça – acrescenta.